A PROPÓSITO DA ESCOLA NO ESTADO NOVO
Crianças da escola primária - meados dos anos 30 |
Todas estas crianças estavam a cargo de uma única professora, devidamente separadas por sexos (tanto na foto como nos horários - umas de manhã e outras de tarde), depois da Revolução Nacional e do Estado Novo terem acabado com as veleidades da coeducação da I República.
Assim, esta professora tinha uma turma de um sexo de manhã (com todos os níveis misturados) e a outra, de outro sexo, de tarde. Se fizermos bem as contas, são 48 crianças. E a escolaridade obrigatória era de 3 anos (só nos anos 50 passaria para 4 anos para os rapazes e 3 para as meninas, até que, finalmente, em 1960 passou a ser de 4 anos para ambos os sexos, e em 1964 de 6 anos).
Como se pode constatar, só depois do final da II Grande Guerra Mundial (1945) foram implementadas alterações (para melhor) na maneira de abordar a educação, considerada uma necessidade maior do que nos anos anteriores, pois existia no interior do regime uma corrente desenvolvimentista (sobretudo ligada aos engenheiros saídos do IST) que defendia a industrialização do país (embora o peso do ruralismo continuasse a dominar - só a partir de 1963 é que o setor Primário deixou de ter o maior peso percentual no PIB).
Mesmo sendo o conjunto dos anos do salazarismo um período "retrógrado" em relação à educação, há uma visão ultraconservadora nos anos 30, a que sucedeu outra já com algumas preocupações de encurtar o fosso das estatísticas da educação que nos separava, então, dos restantes países europeus mais desenvolvidos.
Exemplos desta visão ultraconservadora:
- A campanha patriótica para a extinção do analfabetismo em Portugal
- As declarações de Eusébio Tamagnini, Ministro da Instrução, imortalizadas pelo Diário de Notícias, sobre as diferenças percentuais entre os alunos que constituem a população escolar - 8% são "ineducáveis", 15% são "normais estúpidos", 60% têm "inteligência média", 15%, "inteligência superior" e 2% são notáveis, concluindo que os 23% dos dois primeiros grupos não precisam de ter ensino complementar e que para dar este nível aos restantes 450 mil alunos seriam necessárias mais 190 escolas e 270 professores, tudo isso representando um aumento de despesa de 4 mil contos anuais.
Seguem-se dois pequenos textos de um livro de leitura para o Ensino Primário. Saliente-se as expectativas colocadas, em termos de escolaridade e de família, às alunas da época.
A Felicidade pelo estudo
Desde pequenina a Maria de Fátima gostava de ter os vestidos arrumados e limpos. De vez em quando lá deixava algum brinquedo fora do seu lugar, mas bastava uma pequena advertência da mãe para pôr tudo como devia.
Na escola desde a primeira classe que tem merecido a simpatia da sua professora pela pontualidade com que todos os dias comparece, pela prontidão com que faz os exercícios, pela boa vontade com que escuta os seus conselhos e pelo arranjo e asseio dos livros e dos cadernos.
Não é muito inteligente, mas é das que mais sabem. E o seu amor ao estudo tem-lhe conquistado a amizade e o respeito das condiscípulas.
Os pais julgam-se felizes por terem uma filha assim.
Que prazer que eles não terão quando ela fizer exame da terceira classe!...
Orgulho de mãe
A Maria da Várzea chegava da horta. Trazia à cabeça uma cesta com feijão verde, cenouras, pimentos, couves e nabos, e, ao colo, um filhinho ainda de leite. Na sua frente corria, já em direcção a casa, o Manuel de cinco anos.
Ao vê-la chegar cheia de cansaço e logo rodeada pelos outros quatro filhos, que tinham ficado em casa sob a direcção da mais velha, a senhora D. Arminda, de Lisboa, que estava a passar as férias na aldeia, não pôde conter-se que não dissesse:
- Que pena me faz, senhora Maria da Várzea! Ainda tão nova e já com tantos filhos e tantas fadigas! Eu tenho um, e já me dá que fazer.
Resposta pronta:
- Pois eu, com tanto trabalho e tantos filhos, sinto-me muito feliz, minha senhora. É a vida das mulheres casadas cá da nossa aldeia. Os filhos e as canseiras que eles nos dão é que são a nossa riqueza. É por eles que nós somos felizes.
Para saber mais sobre o assunto recomenda-se Luiza Cortesão (1988). Escola, Sociedade que Relação?, Afrontamento
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